terça-feira, dezembro 01, 2009

A EPIDEMIA DE AIDS NA CHINA: UMA SITUAÇÃO POTENCIALMENTE EXPLOSIVA?

Os primeiros casos de Aids na China surgiram no início da década de 90, cerca de dez anos após o início da epidemia nos países do Hemisfério Ocidental.

No princípio, os casos ficavam restritos às comunidades de usuários de heroína injetada, mas logo surgiu uma epidemia de infecção pelo HIV entre doadores remunerados de sangue e suas famílias, na província de Henan, onde o sangue de vários doadores era misturado, extraía-se o plasma, e as hemácias do "pool" eram reinjetadas nos doadores. Inevitavelmente, a epidemia passou a se disseminar sexualmente, acompanhando o aumento de incidência das demais doenças sexualmente transmissíveis. Atualmente, a estimativa oficial do número de infectados, baseada em estudos sentinela e considerada bastante conservadora, é de 850 mil. Para 2010, tanto a ONU como o próprio governo chinês prevêem dez milhões de infectados.
O clima de apreensão aumenta com as mudanças sociais e econômicas que a China vem experimentando nos últimos anos, que favorecem uma maior freqüência e precocidade das relações sexuais entre os jovens, os quais praticamente não têm acesso à educação sexual. Houve também uma explosão da indústria do sexo comercial, que hoje inclui mais de três milhões de trabalhadores, entre os quais a freqüência de uso de preservativos é muito baixa. Por um lado, o grupo populacional escondido e marginalizado constituído pelos homossexuais masculinos, 80% dos quais casados com mulheres, praticamente não tem acesso à educação sobre práticas de sexo seguro, embora constitua um terço dos pacientes hospitalizados por Aids nos poucos hospitais que atendem pacientes com a doença.
Num país como a China, cuja sociedade civil é pouco organizada, o governo tem sido historicamente responsável por praticamente todas as ações em Saúde Pública; no caso do combate à Aids sua atuação tem se mostrado muito tímida, para dizer o mínimo.
Entretanto, com os recursos de que dispõe e a capacidade de crescimento econômico e progresso tecnológico que tem demonstrado, a China tem potencial para enfrentar o enorme desafio que tem pela frente no combate à AIDS1.

Comentário

O estágio atual da epidemia de HIV/AIDS na China, conforme relatado no artigo, lembra o que ocorria na segunda metade dos anos 80 no Brasil, quando a epidemia crescia de forma geométrica, e não havia organização suficiente da sociedade civil e dos governos para enfrentá-la. No entanto, graças à crescente pressão dos grupos de pacientes, religiosos, ONGs, e a medidas em geral adequadas adotadas pelas várias instâncias de governo, principalmente a partir dos anos 90, o Brasil se tornou um modelo de sucesso e seu programa de prevenção e tratamento exemplo para outros países, o que tem sido objeto de reconhecimento internacional2. Dadas algumas semelhanças entre os dois países, a China, ao desenvolver seu próprio programa de combate ao HIV/AIDS, poderia se basear, pelo menos em parte, no programa brasileiro.
LUIZ AUGUSTO MARCONDES FONSECA
Scielo Brasil / Revista da Associação Médica Brasileira

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